sexta-feira, 28 de junho de 2013

Sozinha

Solidão é igual ratazana, que se esgueira no esgoto da alma esperando a hora de sair. Se sai, não adianta querer se opor a ela: ela te põe medo no mesmo momento em que te mostra os caninos. Mas se você não tem medo, ela é como uma brisa em dia quente, alivia.

Não é bom andar somente com ela, porque duma feita só ela mete um bocado de medo. Como medo de morrer sem segurar a mão de alguém - se eu tiver que partir quero apertar antes a mão suave de quem me ama. Ainda que seja somente o amor da enfermeira, de um cuidador ou de um estranho.
Mas não ter ela ali, pra de vez em quando fugir consigo, é coisa triste. É enfastiado andar rodeado de gente, o tempo inteiro, barulho, sem ouvir a respiração hora ou outra.

Por via das dúvidas, mantenho essa danada ali, no canto. Sei que ela está lá, ela me conhece e me faz companhia.

No final das contas, no fundo só quero que ela não seja protagonista, mas mera coadjuvante nos meus dias.

terça-feira, 11 de junho de 2013

Esquizofrenia

Nesses dias de poeira cósmica, tudo parece bagunçado. A cabeça gira, as ideias piram. Sonhos confusos, de estrelas que procriam e luas cadentes. Um espaço-tempo sem fim entre a dor e o recomeço do flagelo.
Quantas noites hei de acordar lembrando o que não aconteceu na vã tentativa de descobrir o que será?
Quero uma vida normal, como a de qualquer pessoa fora do normal, porque a felicidade não se enquadra nos padrões.
Espero o bonde passar, puxado pelos mamutes que alimentei das minhas vísceras.
Seria a facilidade de caminhar sentindo as pedras no meio dos dedos e entre a carne fraca um desafio para alcançar o céu ou um atalho para o inferno?
Entre príncipes e princesas, escolho meu bruxo favorito para uma fantasia sádica.
Acendo as velas com os próprios dedos, afio a navalha na ponta da língua.
Uso meias coloridas e prefiro abandonar as roupas íntimas. Me entrego sem pensar, vou fundo no precipício aproveitando a brisa enquanto busco o chão.
Me curvo ante a plateia excitada, uivos prazerosos, medos enrustidos e desejos mornos.
Sobre minhas costas os porcos ciscam o resto do jantar de ontem (que mesmo comi?) e lambem minhas costas. De cada lambida um filete de groselha enche minha taça.
E nos devaneios, esquizofrenia desaguada, busco o desapego da realidade insólita.
Me acho nos labirintos da vida, me perdendo por ter medo de querer a saída.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Porque nos teus olhos encontrei esperança
Esse brilho castanho que me faz sorrir.
Esse quê de dia nublado-quase-azulado.
Só não sei porque há o mar...
O mar da minha ansiedade
Agitado, destemperado
Que insiste em lançar ondas sobre meu sossego
Quieto, de canto, sozinho.
E tudo isso no teu olhar.
Castanho, desconfiado.

Olhar que me tens venerado.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

úlcera.

O vento, a alma.
Será o vento uma alma, a vida um sopro?
Corro, cara escancarada contra o vento
Rindo quando deveria chorar, pranteando meus risos.
Vivo nua, despudorada de mim mesma.
Sentindo a carne cortante das palavras não ditas
O ardido violeta das memórias mentidas
Como se fosse uma criança a cair em cada esquina
Levantando, só pra cair de novo.
Me equilibrando na ponta dos pés
À beira do precipício, kamikaze.
Paixão pura, fé cheia de medos.
Porque o medo não abandona quem tem vontade.
Punho levantado, passos firmes, e vacilantes.
Filme dos meus momentos errantes.
Pulsantes.
Vibrantes.
A suave pele que cortada sangra
O escarlate vivo do amor sentido.
Quantos dedos para apontar
O coração ferido.
Flutuando entre a esperança e a quase-vida
O vento me mantém
O sopro da vida.
O medo, o medo.
Um simples sopro para aliviar a úlcera.